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Análise

Alteração da Lei da Nacionalidade está em conformidade com a Constituição de Angola?

Alteração da Lei da Nacionalidade está em conformidade com a Constituição de Angola?


por: Eugénio Costa Almeida*

A alteração à Lei da Nacionalidade, e depois de três adiamentos, foi aprovada a em sessão plenária da Assembleia Nacional, no passado dia 24 de Fevereiro, com os votos favoráveis dos 142 deputados da bancada do MPLA, contra os votos desfavoráveis de 34 deputados das bancadas da UNITA e da CASA-CE, e a abstenção dos deputados da FNLA e do PRS (4), num total de 180 representantes da Nação.

A mesma já tinha sido inicialmente aprovada, em 18 de Junho de 2015, na XI Reunião Plenária Ordinária, da III Sessão Legislativa da Assembleia Nacional, então, na altura, com 141 votos a favor, nenhum voto contra e 24 abstenções, num total de 165 votantes.

Tal como agora, verifica-se que dos 220 assentos que constituem o Hemiciclo se tem verificado a falta, sistemática de deputados em actos considerados relevantes para a vida política e social do País. Recorde-se que do acto eleitoral de Setembro de 2012, a Assembleia Nacional ficou representada por 175 deputados de MPLA, 32 da UNITA, 8 da CASA-CE, 3 do PRS e 2 da FNLA…

A nova lei, – a inicialmente apresentada, em 2014, foi da iniciativa do Senhor Presidente da República, José Eduardo dos Santos, a Lei nº 1/05, de 1 de Julho, – é um documento da iniciativa do Ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Rui Jorge Carneiro Mangueira, prevê que os angolanos nascidos antes de 11 de Novembro de 1975, data da independência nacional, e filhos de não-nacionais, que, até ao presente, não tenham solicitado a confirmação da sua nacionalidade angolana, deixam de o poder fazer; bem como os seus descendentes!

Até aqui, parece nada haver razão que possa suscitar alguma dúvida ou eventual espanto. Só que… E aqui residem as minhas dúvidas!

Primeiro ressaltar dois factos importantes: falo enquanto nacional angolano e enquanto não especialista em questões jurídicas mas com alguma especialização em questões Constitucionais derivadas da minha actividade académica e das minhas licenciatura e mestrado onde aparecia como cadeira importante e objecto de amplo estudo.

Ora, na minha interpretação, todos os cidadãos nascidos em território angolano antes da independência eram – ou têm de ser – considerados estrangeiros dado que o território era, oficialmente, ainda que, natural e politicamente, contestado por todos os que desejávamos a independência de Angola, tal como pelos países contrários aos actos coloniais ainda em vigor, era, escrevia, território colonial português e considerados como portugueses; ou seja, por extensão, todos os residentes, eram estrangeiros à face na nova legislação aprovada.

Acresce que a nossa Constituição – e não sei se esta Lei, agora aprovada, não entra em claro conflito com a nossa Magna Carta, e se não deve ser objecto de análise constitucional – no art.º 9 (Nacionalidade), nº 3 diz que «Presume-se cidadão angolano de origem o recém-nascido achado em território angolano» e no nº 4 «Nenhum cidadão angolano de origem pode ser privado da nacionalidade originária».

Ainda que no nº 5 do mesmo artigo diga que «A lei estabelece os requisitos de aquisição, perda e reaquisição da nacionalidade angolana» ela não diz que o Parlamento esteja legalmente autorizado a retirar um normativo já constitucionalmente adquirido.

Ou seja, todos os nascidos em Angola – e a Lei Constitucional dá claramente, relevância ao “jus soli” – são angolanos, apesar do nº 2 do artigo 9, dizer que «É cidadão angolano de origem o filho de pai ou de mãe de nacionalidade angolana, nascido em Angola ou no estrangeiro».

Ora, não podemos esquecer que, oficialmen
te, só passámos a ser considerados nacionais Angolanos após a independência.

Face a estas dúvidas, creio que seria interessante que a Lei desse um período de delonga, antes de entrar em vigor. Não esqueçamos que muitos angolanos, devido às guerras fratricidas tiveram de se ausentar do país, como refugiados, e alguns ainda estão a regressar ao território pátrio e, muitos deles, nunca tiveram oportunidade de regularizar a sua situação nacional.

Parece-me conveniente que esta matéria deveria ter sido objecto de um verdadeiro e amplo debate nacional, quer a nível dos cidadãos, quer a nível de especialistas nacionais e estrangeiros em questões de Nacionalidade e Direitos Humanos, não restrito a nível das cúpulas partidárias e com assento na Assembleia Nacional, e, principalmente, deve ser analisado, quanto à sua constitucionalidade, pelo Tribunal Constitucional.
Só assim se poderá considerar a Lei em conformidade e, dessa forma, entrar em vigor!

Deixo a matéria para os verdadeiros especialistas debaterem esta questão!


*Investigador e Pós-Doutorando