Africa Monitor

Acesso Livre

Corrupção em Negócios Ligados a Pandemia Alarma Sociedade Civil Africana

Corrupção em Negócios Ligados a Pandemia Alarma Sociedade Civil Africana

São várias as denúncias de corrupção no continente envolvendo meios de luta contra a pandemia.

 

Mais de duas dezenas organizações da sociedade civil, incluindo a Friends of Angola (FOA), apelaram recentemente aos Departamentos de Estado e do Tesouro da Administração dos EUA para que invoquem o programa global de sanções Magnitsky Act no combate à corrupção durante a actual pandemia de Covid 19.

Numa carta recentemente dirigida a Mike Pompeo, secretário de Estado dos EUA, e Steven Mnuchin, secretário do Tesouro, as organizações consideram que as medidas tomadas pelos Estados para enfrentar a pandemia e preservar as economias comportam desafios nos planos dos direitos humanos e da corrupção. E recomendam ao Governo norte-americano medidas concretas de apoio às boas práticas de clareza nas mensagens públicas e de orientação técnica às entidades financeiras no actual contexto pandémico. A FOA é uma ONG sedeada em Washington D.C. dotada de estatuto consultivo nas Nações Unidas.

O Magnitsky Act é uma legislação aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos e confirmada pelo Presidente Barack Obama em 2012, criada para punir agentes governamentais russos pela morte de um advogado - Sergei Magnitsky – que investigara uma fraude de milhões de dólares, sem ferir as relações comerciais entre Washington e Moscovo.

O próprio advogado acabou preso por essa fraude, morrendo na prisão em 2009, alegadamente depois de torturado, ainda antes de ser julgado e condenado, o que só sucedeu à revelia em 2013. O caso foi divulgado por Bill Browder, um empresário norte-americano com actividades na Rússia e ex-chefe de Magnitsky, que mobilizou políticos para aprovarem legislação contra agentes governamentais russos envolvidos em corrupção. Em 2017, o Magnitsky Act tornou-se extensível a casos de corrupção e violação de direitos humanos com origem fora dos Estados Unidos, autorizando Washington a proibir a entrada dos envolvidos no país e a congelar os seus bens.

É esta legislação que os subscritores da carta querem ver aplicada pelo Governo norte-americano na luta contra a corrupção relacionada com a pandemia. Segundo entendem, as medidas de combate ao Covid-19 são terreno fértil para a corrupção medrar. E o Magnitsky Act é o mecanismo adequado para levar a cabo uma campanha associada à mensagem de que a apropriação indevida de recursos públicos destinados ao combate à pandemia por via da corrupção será um alvo prioritário dos investigadores, instituições financeiras e aplicadores da lei. Infere-se da carta que os seus autores consideram que se assim for, a corrupção envolvendo equipamentos, como máscaras e ventiladores, por exemplo, medicamentos, como vacinas, e alimentos destinados a enfrentar os efeitos da pandemia será desincentivada, em favor do reforço das soluções minimizadoras do impacto global do Covid 19.

No texto, os subscritores propõem três grandes medidas para atingir o resultado pretendido. Uma seria a emissão de uma nota por parte do Gabinete de Controlo de Activos Estrangeiros do Tesouro na sua página oficial informando que a corrupção relacionada com o Covid 19 passa a estar abrangida pelo Magnitsky Act. Outra seria o reforço desta mensagem por parte do Departamento de Estado através de orientações às representações diplomáticas norte-americanas e outras entidades no sentido de apoiarem programas anti-corrupção e identificarem transgressores susceptíveis de ficarem sujeitos a sanções ao abrigo desta legislação. Finalmente, sugerem que a Financial Crimes Enforcement Network (FinCEN), a agência do Departamento do Tesouro responsável pelo combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo, garanta que a corrupção na distribuição de recursos para combate ao Covid 19 está sujeita ao Magnitsky Act e que as instituições financeiras estejam prontas a implementar as orientações emitidas nesse sentido.

Em África, onde entre 300 mil a 3,3 milhões de pessoas podem morrer vítimas do Covid-19, dependendo do nível de intervenção para travar a pandemia, segundo um relatório da Comissão Económica das Nações Unidas para a África (ECA, no acrónimo em inglês) publicado em Abril, a resposta em cuidados de saúde está estimada entre 44 mil milhões e 446 mil milhões de dólares, conforme já reportámos. Um mercado suficientemente tentador num continente frequentemente associado a deficientes mecanismos de controlo e fiscalização das transacções financeiras. E onde têm sido reportados vários casos de corrupção relacionados com o contexto pandémico presente.

No Malawi, deputados e ministros terão tentado obter centenas de euros por dia para si próprios subtraídos a subsídios atribuídos à luta contra o Covid 19. Apesar de o terem negado, permaneceu a suspeição pública, segundo o Deutsche Welle. No Zimbabwe, o ministro da Saúde, Obadiyah Moyo, foi preso e acusado de corrupção na aquisição de equipamentos de protecção pessoal e medicamentos relacionados com o combate ao Covid 19. Segundo a estação televisiva sul-africana SABC, Moyo terá pago ao fornecedor um valor muito superior ao devido, indiciando sobrefacturação. Em Maio, a BBC noticiava que no Uganda vários deputados foram judicialmente obrigados a devolver 5 mil dólares cada um, num total de 2,6 milhões de dólares. Os deputados tinham atribuído esse valor a si próprios a partir de um montante que lhes fora destinado para combater a pandemia nas suas circunscrições. Na mesma ocasião, a BBC também reportou o caso de um relatório apresentado por um governante queniano no Parlamento nacional, que dava conta da aplicação de 12,2 milhões de dólares doados pelo Banco Mundial, mas que se tornou controverso devido à difícil justificação para algumas despesas, como comunicação, aluguer de ambulâncias e consumo de snacks e chás. Já na África do Sul estão em investigação queixas de corrupção relacionadas com um fundo de 26,3 milhões de dólares alocado pelo Governo à minimização do impacto do Covid 19 no país. Parte das queixas envolvem corrupção relacionada com a produção de máscaras faciais, distribuição de alimentos e captação de fundos de forma fraudulenta para supostas campanhas de sensibilização. Outra parte estará relacionada com candidaturas de empresários a subsídios de apoio a pagamento de salários, no âmbito do mesmo fundo, mas que não estarão a chegar aos devidos destinatários, os trabalhadores. (JA)

 

Nota: O autor não escreve segundo as regras do Acordo Ortográfico